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Papangu - Holoceno lyrics



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02. Água Branca

A pedra branca eu pus no meio do verdume
A fumaça feia cheirava a profecia
O sol do maçarico um velho vaga-lume
No seio do negrume a chama reluzia

O verbo de mágica na caixa do fósforo
Separa do fogo a terra sutil do espesso
Teu osso como gesso e em fervorosa
O sangue à fé ligeiro se assemelha

Os louros que te adornam
O couro temperado
O som da agonia
A água branca fria

Os estalos da língua
Um lado bem passado
Um futuro de cinza
A água branca fria

03. São Francisco

Munido de carrancas
Amainando os espíritos
Afastando os demônios do grande chico

A correnteza do rio
O barco vai afundar
A água que dá a vida traz a morte
Em meio a um motim
Um barco dividido
A sorte ruim que saiu da carranca

São francisco

Na terra dos tapuias
Criados por opará
Vivendo dessas águas
E dessas terras
Relíquia dos sertões
Jogada aos braços de ci
Homens privam seus sonhos
Enfrentando a sua fúria

Carranca mortal veio para destruir
Causando enchentes e terremotos
Afundando barcos e construções
Levando tudo às profundezas

04. Bacia Das Almas

Eu confiei na palavra com a gula
Do jovem que nunca viu chuva nem carne

O osso que eu entrego pra enterrar e exumar
Desterra pra cozinhar

Eu mergulhei na bacia das almas
Dissolve os nervos da face desmascara

O erro que feito medo encravou meu coração
Correção destas apostas tombadas há muito mortas

05. Terra Arrasada

Verme homem terra chão

Rega o chão salga a terra
Sangue escuro de quem era

Resistir levantar demarcar crucificar

Ninguém assistiu ao enterro tão inevitável
Sempre calejada a mão que afaga apedrejou
É melhor morrer resistindo é melhor lutar
Se morrer de fome eu rego a terra com meu sangue
A lama espera o teu corpo terra arrasada
Véspera do escarro a mão que afaga apedrejou

06. Lobisomem

Do sétimo filho vai nascer um lobo
Que se perde e pede socorro
Nada pode lhe parar: nem a prata, nem rezar
O demônio vai partir, vai uivar e vai rugir

Corpo enegrecido olhos feito a lua
Mente podre obscura vazia e crua
Quando minha mão chegar na garganta da fera
Vou provar ao povo meu ou pro inferno vou com seu terror

Besta-fera demônio assombração lobisomem

"Quando eu morrer, não soltem meu cavalo
Nas pedras do meu pasto incendiado
Fustiguem-lhe seu dorso alanceado
Com a espora d'ouro, até matá-lo

Um dos meus filhos deve cavalgá-lo
Numa sela de couro esverdeado
Que arraste pelo chão pedroso e pardo
Chapas de cobre, sinos e badalos

Assim, com o raio e o cobre percutido
Tropel de cascos, sangue do castanho
talvez se finja o som d'ouro fundido

que'em vão, sangue insensato e vagabundo
tentei forjar, no meu cantar estranho
À tez da minha fera e ao sol do mundo'

'Mas eu enfrentarei o sol divino
O olhar sagrado em que a pantera arde
Saberei porque a teia do destino
Não houve quem cortasse ou desatasse

Não serei orgulhoso nem covarde
Que o sangue se rebela ao toque e ao sino
Verei feita em topázio a luz da tarde
Pedra do sono e cetro do assassino

Ela virá, mulher, aflando as asas
Com os dentes de cristal, feitos de brasas
E há de sagrar-me a vista o gavião

Mas sei, também, que só assim verei
A coroa da chama e deus, meu rei
Assentado em seu trono do sertão"

07. Holoceno

Cai o véu um tecido de pedra
Vem o céu fechar-se na terra
Um a um o abismo arrebata
Acalanto elegia de graça

E o homem essa luz do mundo
Que habita a cidade no monte
Raspa o tacho repete devora
Alimenta a penumbra no fundo